Em 1973, o regime militar considerava que havia uma situação política e economicamente confortável para ungir um presidente que pudesse promover uma distensão política.
A agenda de distensão política do governo Geisel não deve ser vista, porém, como uma redemocratização no sentido pleno do termo. Como explicou o historiador Jorge Ferreira, Geisel planejava a constitucionalização do regime, mas não o retorno do país à democracia liberal.
Tratava-se, adicionou o historiador Francisco Carlos Teixeira, de “uma volta organizada aos quartéis enquanto a ditadura tinha algum prestígio”. A liberalização deveria resultar em garantias para os militares: evitar o retorno ao cenário político das lideranças, instituições e partidos políticos anteriores a 1964; durar um longo período, cerca de 10 anos: e elaborar nova Constituição pelo regime autoritário com salvaguardas para as Forças Armadas.
Em 1974, porém, contrariando os planos governamentais, o MDB, a legenda da oposição, mostrou, pela primeira vez, força eleitoral, uma tendência que se acentuou nos anos seguintes.
Na segunda metade da década, o movimento estudantil se rearticulou, surgiu uma nova geração de sindicalistas e novos movimentos sociais e populares ocuparam a cena pública. Foi esse impulso da sociedade civil, argumentou o historiador Marcos Napolitano, que transformou a distensão planejada pelo governo em uma agenda de abertura e redemocratização.
Além disso, o período do chamado milagre econômico acabara e as frágeis bases em que ocorrera ficaram explícitas, com a redução das taxas de crescimento do PIB, com a elevação da inflação e com a disparada da dívida externa, cujos serviços condicionavam a economia interna.
A sociedade civil, rearticulada, apresentava pautas de redemocratização, reivindicando reforma no sistema partidário para a reinstituição do pluripartidarismo, anistia, eleições livres e soberanas a todos os cargos e, acima de tudo, uma Assembleia Nacional Constituinte.
Por seu turno, Geisel tentou conter esse processo por meio de medidas duras, como as previstas no Pacote de Abril, quando fechou o congresso nacional e impôs uma série de medidas que tinham repercussão no plano eleitoral e representativo: rebaixou o quórum para modificar a Constituição, estabeleceu um novo critério de proporcionalidade parlamentar para potencializar as bancadas da Arena, reservou uma das três cadeiras de senadores a que cada estado tinha direito para uma eleição indireta, nos moldes da que ocorria para governador.
Quando se aproximou o calendário da sucessão presidencial, o MDB voltou a apresentar um candidato no Colégio Eleitoral. Desta vez, foi um militar, o general Euler Bentes, acompanhado pelo senador Paulo Brossard como vice. A Arena cacifou o general João Batista Figueiredo, chefe do SNI, cujo vice era o ex-governador de Minas Gerais, Aureliano Chaves. Quando o Colégio Eleitoral se reuniu para sufragar o nome do presidente, como era previsível, o candidato oficial obteve maioria. O resultado foi o seguinte: Figueiredo: 355 votos; Euler Bentes, 255.
O general Figueiredo assumiu a presidência em uma conjuntura de crise econômica e política do regime militar e de ascensão das lutas sociais, de fortalecimento do MDB e de uma agenda, impulsionada pela sociedade civil, de abertura e redemocratização. A transição, porém, seria lenta e tortuosa.