Golpe de Estado de 1964: 31 de março ou 1º de abril?
A semana na História

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Golpe de Estado de 1964: 31 de março ou 1º de abril?

A semana na História por Reginaldo Dias em 31/03/2025 - 11:50

O nosso tema de hoje é um fato da história recente do país, um fato que, em nossos dias, gera debates acalorados: o golpe de Estado de 1964, que depôs o presidente João Goulart.

Vou abordar as disputas pelo nome do evento e pela data em que ocorreu.  

Os militares que comandaram a queda do presidente Goulart batizaram o evento como “Revolução Democrática de 31 de março”. Ao chamarem de “revolução”, tentaram atribuir uma carga positiva aos acontecimentos, acentuada pela adição do adjetivo “democrático”.

Desde o primeiro momento, os opositores do regime militar confrontaram não apenas a ideia de que houve uma revolução, mas de que ocorreu no dia 31 de março. Chamaram de “Golpe de Estado de 1º. Abril”. Como sabemos, na cultura popular, 1º. de abril é o dia da mentira. Estabelecer a data de 31 de março seria, então, uma tentativa de não relacionar o evento com o dia da mentira.

A literatura acadêmica, produzida por pesquisadores universitários, define que houve um golpe de Estado naqueles dias, caracterizado pela deposição ilegal de um presidente constitucionalmente legítimo, por meio da força militar e de manobras políticas de lideranças civis. De resto, tanto não era uma revolução que a consequência foi o estabelecimento de uma ditadura de 21 anos, a mais longa da história brasileira. Portanto, também não era democrática.

Como fica a questão da data do acontecimento?

Desde a segunda metade de 1963, havia uma conspiração em curso pela deposição do presidente Goulart, envolvendo lideranças das forças armadas e líderes civis, com apoio dos EUA. No aquecimento da conjuntura política no início de 1964, havia planos para que a deposição ocorresse no início de abril, mas a reação a um pronunciamento do presidente Goulart, transmitido na noite de 30 de março, motivou o general Olympio Mourão a, precipitadamente, dar início ao deslocamento de tropas na madrugada de 31 de março. Invadindo o dia primeiro de abril, a tensão foi se acentuando porque havia a expectativa de que o presidente reagisse.

Goulart, porém, foi informado de que os rebeldes tinham um plano de contingência para o caso de conflagração nacional, com apoio político, logístico e militar dos EUA. Político porque os EUA reconheceriam como legítimas as áreas de controle dos rebeldes. Logístico e militar porque já estava em curso o deslocamento, por mar, de uma esquadra com equipamentos bélicos, porta aviões e combustível para municiar e apoiar os militares insurretos. Há farta documentação disponível sobre essa operação, batizada de “Brother Sam”. Quem tiver interesse pode assistir ao filme documentário O dia que durou 21 anos, disponível no canal Youtube, que narra detalhadamente essa operação.

O presidente João Goulart preferiu evitar a guerra civil.

A queda de Goulart foi consumada na madrugada de 2 de abril, em sessão extraordinária do Congresso Nacional. O presidente do Congresso, senador Auro Moura Andrade, abriu a sessão, fez um discurso inflamado dizendo que o presidente havia abandonado o país e que o país não poderia ficar acéfalo. Encerrou declarando vaga a presidência da república. Esse discurso falsificava os acontecimentos. O presidente não apenas estava no país, como havia, preventivamente, notificado o Congresso Nacional por escrito. O presidente da República só pode perder o mandato mediante processo de impeachment, com denúncia, defesa e julgamento. Não foi o que ocorreu. Foi um ato sumário, sem qualquer rito, sem que os parlamentares pudessem se manifestar. Logo em seguida, empossaram o presidente da Câmara como presidente interino. O poder, de fato, estava com a Junta Militar.

Portanto, foi na calada da madrugada de 2 abril, precisamente às 3h45, que o golpe de Estado foi consumado.

Ouça "A Semana na História" toda segunda-feira, com o professor e historiador Reginaldo Dias, às 11h50, com reprises às 14h50


 

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