Opinião
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“Cego” fala de pessoas, quem “vê” entende o contexto
O comentário de Gilson Aguiar por Gilson Aguiar em 02/01/2025 - 11:10
Nunca nos falta assunto.
Sempre estamos dispostos a falar sobre algo de nosso interesse. Inclusive, o que nos interessa diz muito sobre nós. Aquilo que é a pauta constante de nossas conversas é uma demonstração de nossa preocupação. Resumindo, quem fala muito sobre um determinado tema é porque se importa com ele.
Tem quem tente desmentir, quando alguém se separa de outra pessoa, conversa sobre ela com todos que o conheciam, quase sempre dizendo que não gosta mais, que não tem o menor interesse, mas não tira a pessoa da sua pauta.
Tudo o que se anuncia demais ou em demasiado com desdém se tem interesse. Como dizia a minha avó, “não se chuta cachorro morto”. Quem chuta é porque quer ressuscitá-lo.
O risco da lógica da particularidade.
Porém, do que se gosta de falar, da pessoa ou do contexto? Gostamos de falar da questão em que as pessoas estão envolvidas ou das pessoas envolvidas na questão?
Eu vou explicar!
Podemos falar da violência ou ficarmos remoendo o violento; podemos falar da traição ou ficar amaldiçoando o traidor; podemos entender o assassinato ou ficar especulando o assassino.
Se ficarmos mais tempo em busca de julgar o agente da ação do que entender o porquê ela ocorre, empobrecemos o entendimento da questão. Quanto mais reduzirmos os elementos de compreensão de um fato às pessoas envolvidas, menor será nossa capacidade de entendê-lo. Podemos até explicá-lo, mas não compreender a sua dimensão.
Sempre é mais fácil de explicar com poucos argumentos a vontade do indivíduo envolvido, se ele é “bom” ou “mau”. Separar o mundo do mundo entre bandidos e mocinhos contribui para critérios pobres no entendimento de temas complexos.
A “coisa” é mais complicada e complexa.
A vida não se explica com tanta facilidade assim. Émile Durkheim, um dos clássicos das ciências sociais considera que tudo o que se explica de forma simples na vida social é uma mentira. Ainda mais quando envolve uma cadeia de indivíduos dentro de um grau de dependência complexo em sua vida cotidiana.
Porém, vivemos tempos de empobrecimento de raciocínio para facilitar o entendimento de quem tem pouca capacidade de compreensão. A onda estimulante da vida é dar ao que não pode a sensação de poder. Assim, colocamos em risco a realidade para atender a satisfação do indivíduo. A lógica típica da sociedade de consumo e do espetáculo.
Exaltamos o indivíduo, dependente de uma sociedade, para colocá-lo em um protagonismo que não lhe cabe. Tanto na ação dos fatos como na compreensão dele. O sujeito, o particular, virou foco e exaltação para o entendimento do mundo.
Por isso, escolha o contexto e não as pessoas.
Vale lembrar que as coisas não são feitas por seres isolados. Há protagonistas múltiplos em um mesmo fato. Se não formos capazes de compreender quantos envolvidos existem naquilo que se faz iremos reduzir a capacidade de compreensão, avaliação e julgamento do que é feito.
Essa limitação na compreensão do complexo é que alimenta a violência, o radicalismo, o extremismo e as ações precipitadas. Estas ações que fazem vítimas inocentes e que atingem sempre os que não são os verdadeiros responsáveis pelas ações.
Não somos tão “heróis” assim e os outros não são tão bandidos. Ninguém é santo, mas o inferno não está tão cheio. Da mesma forma que não há um ser humano perfeito, ninguém é só imperfeito. Seres humanos tidos como honrados a décadas atrás hoje podem ser considerados machistas e autoritários, egoístas e violentos.
Quantos homens foram absolvidos ao matar a esposa por traição a décadas atrás e hoje jamais seriam absolvidos? Por isso, não se julga as pessoas sem entender o contexto e condição que envolve a ação. Se quer ser ético, pense nisso.
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